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Por Phillan Zamchiya, Clemente Ntauazi e Joana Noyes

Um dos eventos mais dramáticos na África pós-colonial é o rápido impulso para a formalização dos direitos de propriedade de terra, para as pessoas que vivem em terras com direito costumeiro. Na Africa Subsaariana cerca de 90% da terra esta sob regime costumeiro. A posse costumeira pode ser definida como um conjunto de regras e normas que regem a atribuição, utilização e acesso, controlo, propriedade e transferência de terras e outros recursos naturais. É imperativo que as políticas tomem em conta que a maioria dos sistemas de posse de terras em África incluam direitos individuais, terras aráveis e recursos de propriedade comum.

A terra é normalmente governada sob a autoridade da liderança ‘tradicional’, famílias ou clãs sob os costumes das comunidades locais. Entre 1990 e 2017 foram promulgadas 32 novas leis de terra em toda a África subsaariana, muitas delas com enfoque na formalização de direitos sobre terras consuetudinárias. A nova onda de formalização no continente permite o levantamento de delimitações, registo e documentação, arrendamento e transferências de terras consuetudinárias. Isto destina-se em parte a reduzir os conflitos, permitir investimentos responsáveis e proteger os direitos das comunidades sobre a terra.

Photo: Livaningo

Governos africanos, organizações da sociedade civil (OSC) e agências doadoras ocidentais capitalizaram a nova vaga para introduzir mecanismos de acompanhamento (programas que defendem o registo dos direitos consuetudinários à terra) como forma de proteger os pobres do aumento da procura de terra. Estes programas estão incorporados em modelos evolutivos de direitos de posse da terra que prestam pouca atenção às dinâmicas locais e às suas implicações para as mulheres. Uma questão crítica permanece, portanto, sem resposta: como é que a formalização dos direitos consuetudinários à terra afecta a segurança da posse da terra para as mulheres rurais e com que implicações para os decisores políticos? Alguns estudos de mostram que a formalização trouxe melhor segurança do que antes. Por exemplo, Wily argumenta que em 30 dos 47 países africanos, as reformas da posse de terra através do processo de formalização trouxeram uma melhor protecção dos direitos de terra, em comparação a situação anterior. Contudo, inquéritos recentes da Prindex ainda mostram que na África subsariana quase 50% das mulheres temem perder as suas terras em caso de divórcio ou morte de um cônjuge. Dada a natureza contestada dos resultados, o debate pode ser enriquecido para além dos inquéritos estatísticos, da análise da literatura e das persuasões ideológicas, através de estudos de casos etnográficos sólidos.

Foi a partir desta perspectiva que conduzimos uma primeira fase de entrevistas em profundidade, histórias de vida e discussões em grupos de focais (FGDs) com 63 mulheres que vivem sob a posse costumeira no distrito de Nhamatanda, localizado na província de Sofala, Moçambique, em Fevereiro de 2021. Moçambique é um estudo de caso interessante, porque a Lei de Terras de 1997 e os seus regulamentos prevêem o reconhecimento dos direitos consuetudinários e de ocupação de boa fé da terra, e estabelecem os mecanismos de registo destes direitos de uso da terra conhecidos como Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) para indivíduos, comunidades e investidores.

O Governo de Moçambique lançou, portanto, o programa Terra Segura em 2015. Consistentes com os projectos de modernização do Estado, o programa propôs-se atribuir cinco milhões de DUAT (individuais), delimitar 4.000 terras comunitárias  em sete anos – uma meta que nunca foi atingida. Os doadores ocidentais apoiaram o programa. Um desenvolvimento mais significativo foi a 4 de Dezembro de 2018 quando o Grupo do Banco Mundial (GBM), um proponente a longo prazo das privatizações de direitos de propriedade, aprovou 100 milhões de USD para apoiar o programa, com o objectivo de regularizar dois milhões de DUATs, delimitar e emitir  1.200 certificados de delimitação comunitária ocupados por comunidades locais em 71 distritos seleccionados (45% dos 157 distritos em Moçambique). O programa visa que 40% dos beneficiários sejam mulheres.

As implicações em termos de género de tal programa de modernização foram  acentuadas em Nhamatanda, onde a maioria das mulheres vive da agricultura de pequena escala, numa área devastada  por vários ciclones, de difícil  acesso   durante a estação chuvosa  e localizada numa província onde 42,2% da população vive abaixo da linha da pobreza. Das  entrevistas realizadas, a maioria das mulheres vulneráveis desconhecia a Lei Moçambicana de Terra de 1997, o programa Terra Segura e o GBM e outros processos conduzidos por doadores, destinados a registar os seus direitos de terra. Isto mostrou uma consulta pública limitada nos processos de elaboração de políticas. Por exemplo, Dorca Domingo John, uma mulher casada com seis filhos, explicou: “Nunca ouvi falar do DUAT e não sei o que é”. Esta linha de resposta era comum entre a maioria das mulheres que entrevistadas. No entanto, a consulta pode aumentar a eficácia na implementação e reforçar o cumprimento, porque gera um sentimento de copropriedade e legitimidade. Contudo, algumas mulheres com melhor acesso à informação através da participação em grupos locais como a Associação Nzeru Mbaili sabiam do DUAT, mas não conheciam o processo de aquisição do mesmo. Finicha Domingos, uma mulher casada com cinco filhos atestou: “Ouvi falar  do DUAT, foi-me dito por uma organização da sociedade civil que é importante garantir a posse de terra em caso de conflitos, mas não sei como e onde adquirir o DUAT”. Mesmo as mulheres que planeavam adquirir independentemente o DUAT não tinham qualquer informação sobre o custo. Em estimativa, custa cerca de 400 dólares para registar entre 2-10 hectares de terra que estava muito fora do alcance de famílias humildes em Nhamatanda.

Além disso, os decisores políticos assumiram que todas as pessoas queriam adquirir o DUAT. Entretanto, alguns dos entrevistados não compreenderam a lógica do mesmo, depois de viverem durante décadas sem qualquer papel para provar a posse. Um deles explicou: “Simplesmente não sei porque tenho de adquirir um DUAT agora. Há muitos anos que vivo e cultivo aqui com a minha família sem qualquer documento”. Eles queixaram-se de que os funcionários do Estado não lhes davam escolha sobre o ter ou não o DUAT. Como Fukuyama argumentou, poder escolher é uma das pedras angulares do desenvolvimento. Outros não acreditavam que os direitos consuetudinários precisassem de ser registados, a fim de se tornarem seguros.

Um participante da pesquisa explicou: “Ter um DUAT deve ser um processo voluntário e não obrigatório, mas o governo está a forçar-nos a todos a tê-lo, como se fosse um mecanismo seguro para garantir a terra. Tenho visto pessoas a perder terras com os seus DUATs na mão”. Saquista Jossias, uma mãe divorciada com seis filhos, disse: “Ouvimos dizer que nas províncias de Tete, Nampula e Zambézia, alguns pequenos agricultores perderam as suas terras com o DUAT na mão a favor de investidores locais e internacionais”. Eles pensavam que iriam conseguir fazer valer os seus direitos contra o grande capital. Embora a Lei de Terras de 1997 não tornasse obrigatório o registo dos direitos de uso da terra, os funcionários do Estado reforçaram esta como a única alternativa, pois ameaçaram excluir aqueles sem o DUAT de outros programas financiados pelo Estado. Consequentemente, alguns registaram as suas terras porque esperavam receber insumos agrícolas do governo.

Apesar de o projecto ter sido lançado como obrigatório pelos funcionários do estado, teve consequências em termos de género. O processo de delimitação de terras marginalizou as mulheres, uma vez que a maioria não foi consultada, como exigido pela lei. A demarcação foi impulsionada de cima e fez eco ao que Scott chama de alta modernização autoritária. Foi liderada por tecnocratas dos Serviços Provinciais de Geografia e Cadastro (SPGC), consultores privados e uma secretária de bairro que representava o Estado a nível da aldeia, gerindo mais de 200 famílias e os seus representantes. O secretário do bairro de Nhamatanda foi eleito a partir de um grupo de quadros do partido Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) no poder. Por sua vez, ele nomearia um chefe de unidade (gerindo entre 30 a 200 agregados familiares), um chefe de bloco (gerindo entre 10 a 30 agregados familiares) e um chefe de 10 agregados familiares. Os secretários eram homens e eram conhecidos como ‘o galo’ no léxico local de Nhamatanda.

Photo: Livaningo

As suas ligações às elites políticas nacionais do partido governamental, FRELIMO, deram-lhes poder local para influenciar a forma como a terra local era gerida, como também demonstrado por Fairbairn num estudo separado. Os tecnocratas dos SPGC visitavam as terras sem aviso prévio, usavam a sua autoridade burocrática para dizer a quem estivesse disponível que queriam medir as terras. Por exemplo, Lida Waite explicou que em 2019 os tecnocratas foram a sua casa e disseram “que queriam medir o terreno à volta da minha casa”. Eles não nos disseram para que era. Aceitámos, porque era o governo”. Em alguns casos, passaram pelo processo com jovens membros da família que tinham poucos conhecimentos sobre os limites. Francisca Joaquim, uma viúva com seis filhos, explicou: “Quando a equipa do governo veio à minha casa, eu estava ausente. Falaram com o meu filho de 20 anos”. As demarcações foram aprovadas pelos secretários locais. Não houve uma consulta adequada, como exigido por lei, mas devido a relações de poder distorcidas, as mulheres locais não tinham espaço para contestar os limites arbitrariamente atribuídos.

A maioria dos DUATs estão em nome de maridos ou parentes masculinos das mulheres. Era suposto que as mulheres se beneficiassem, sendo elas esposas de proprietários de terras em lares idealizados. Isto apesar das disposições da política que permitem o registo conjunto. Segundo Lorenço Mavunguire, o Chefe da localidade de Siluvo, “800 DUATs em 3.000 estão em nome de mulheres, sendo a maioria delas viúvas”. Isto traduz-se em apenas 26,6% de mulheres com DUAT, o que é menos do que o objectivo do GBM de 40%. Isto é consistente com os dados de 2015 da Direcção Nacional de Terras em Moçambique, que mostraram que apenas 20% dos DUATs foram registados em nome de mulheres.

Realizámos uma discussão em grupos de focais  com detentores de DUAT na aldeia de Siluvo com 12 mulheres e oito homens. Todos os oito homens tinham DUATs em seus nomes. Nenhuma das quatro mulheres casadas que estavam presentes tinha DUATs em seu nome. Das oito mulheres que tinham DUATs, seis eram viúvas e duas estavam divorciadas. Maria Nsosu, mãe de três filhos, cujas terras estão registadas em nome do seu marido, fez eco do seu descontentamento: “A terra em que vivemos foi registada em nome do meu marido. Não me sinto segura porque se o nosso casamento terminar, serei expulsa sem quaisquer direitos”. Outro participante disse: “Gostaria de ter terra em meu nome porque sou eu que trabalho a terra e não o meu marido. E porque não quero perder terras e outros recursos à volta da casa quando o meu marido morrer”.

Duas explicações eram evidentes quanto ao porquê de os títulos não estarem registados em nomes de mulheres casadas. Primeiro, a política de facto do governo é que o homem é o chefe da família e, portanto, deveria ser ele a registar o DUAT em seu nome. Uma participante fundamentou: “Eu queria registar o terreno em meu nome, mas os agentes do governo disseram-me que eu devia registá-lo em nome do meu marido porque ele é o chefe da casa”. A segunda explicação é a natureza patriarcal da sociedade e as relações desiguais de poder. Tal como outra mulher recordou, “embora o meu marido não estivesse por perto, registei-o em seu nome porque o respeito e ele é o dono da casa”. Ela não sabia que havia a possibilidade de haver um registo conjunto. Por outro lado, as viúvas e divorciadas tinham mais hipóteses de ter o terreno registado em seu próprio nome, não por ditames das políticas, mas por padrão.

As respostas sobre o DUAT continuaram a ser diversas. Algumas mulheres com DUAT pensavam que poderiam fazer valer os seus direitos de propriedade contra investidores, forasteiros e membros da família que pudessem querer despejá-las em caso de disputas. Em geral, havia a crença de que o DUAT reduziria os conflitos locais e as lutas pela terra. Nesta medida, pode-se argumentar que a formalização está a melhorar as percepções de segurança da posse para alguns beneficiários. Lídia Waite, que obteve um DUAT, disse: “Posso mostrar este documento a qualquer pessoa que venha reclamar direitos sobre as minhas terras. Sinto que estou segura agora”. Com base na educação que recebeu de uma OSC, Lídia explicou ainda, “sabemos que o DUAT pode prevenir conflitos ou posso assegurar a minha terra se um investidor vier reclamá-la”. Florinda Sibanande, outra beneficiária, concordou: “Agora que temos um DUAT estamos a salvo e estou feliz, porque pelo menos aqui em minha casa ninguém virá tirar-me as terras da minha machamba”. Aurora Wissunesabe estava confiante de que o DUAT iria protegê-la em caso de divórcio. Ela disse: “quando um homem se divorcia da sua mulher, leva sempre coisas com ele”. A mulher fica sem nada. O homem pensa que tudo lhe pertence…mas agora o DUAT vai proteger a mulher”. Estes foram alguns dos benefícios previstos, frequentemente repetidos por algumas beneficiárias em Nhamatanda, especialmente as que são activas na sociedade civil.

No entanto, as pessoas reclamaram da documentação limitada dos direitos de uso da terra, pois as autoridades ignoraram suas terras aráveis e recursos comuns. Isso era consistente com a simplificação dos sistemas de posse na política moderna, que prefere capturar apenas o que os tecnocratas querem ou podem ver. Lídia reclamou que “o governo não está a dar-nos DUAT para nossas machambas, mas para habitação”.

Para fundamentar, Francisca Benjamin Joaquim possuía 4,5 hectares de terreno agrícola e um hectare de terreno residencial; no entanto, só lhe foi concedido um DUAT para este último. O receio foi exacerbado pelo facto de não possuírem um DUAT comunitário para aceder a recursos comuns. Temiam que outra entidade pudesse receber o DUAT em áreas que cobriam recursos comuns e os impedissem de aceder a recursos naturais tais como lenha, plantas medicinais, carvão vegetal, erva para colmo, fontes de água e terras de pastagem. Ao não registar os campos de cultivo (machambas) e áreas comuns, a formalização poderia resultar numa trampa   de direitos de acesso, utilização e propriedade socialmente reconhecidos, múltiplos e sobrepostos, sendo o Estado um instrumento silencioso de desapropriação em favor da acumulação de capital privado. Esta análise não é infundada.

Segundo o GBM, o impacto a longo prazo do projecto é melhorar “o ambiente para a criação de iniciativas de investimento por parte das famílias, comunidades ou do sector privado”. Um dos principais resultados é “assegurar que 90% do SiGIT esteja actualizado, operacional e disponível para utilização, incluindo um portal web que permita o acesso público aos dados cadastrais fundiários nacionais”. Ao registar terras no Sistema de Gestão de Informação Fundiária (SiGIT), estes tendem a proteger os pobres com posse insegura, contra o elevado aumento da procura de terrenos habituais, mas ao mesmo tempo fornecem mapas estatais de legibilidade aos investidores. Isto tornará as terras habituais mais visíveis para o mercado (que não é neutro em termos de género) e criará condições que poderão resultar na perda de terras para muitas das mulheres rurais pobres.

Apesar das reformas radicais, a posse costumeira ainda manteve características de negociabilidade, flexibilidade e adaptabilidade que funcionaram bem para algumas mulheres rurais marginalizadas e vulneráveis. Algumas que fugiram da violência baseada no género, da guerra e das catástrofes naturais das suas aldeias de origem ou que sofreram crises de subsistência, conseguiram negociar a terra através de relações sociais. Francisca Benjamin Joaquim, uma viúva, explicou: “Antes de viver na Rua Domingo, eu estava na cidade da Beira. Viver na cidade da Beira era difícil porque era difícil conseguir comida e outras coisas. Eu queria cultivar como os meus pais e facilmente obter comida da minha machamba. Depois fui para a aldeia de Siluvo, onde os meus pais já viviam e cultivavam. Quando lá cheguei, os meus pais deram-me terra para cultivar.

Gendered Implications of Formalisation of Customary Tenure in Mozambique

Photo: Livaningo

Como Florinda Sibanande, outras mulheres obtiveram acesso à terra e adquiriram novos direitos através dos seus sogros. Como Florinda recordou, “esta terra foi-me dada pela família do meu marido através da minha sogra”. Algumas até negociaram com secretários locais que administravam terras nas aldeias para obter terras. Por outro lado, os costumes não eram estáticos, pois encontrámos menos casos de viúvas a serem despejadas por membros da família. No entanto, não se pode romantizar as relações sociais, uma vez que as relações de poder e o patriarcado entre homens e mulheres permanecem reais. Além disso, o acesso à terra habitual já não se fazia apenas através das relações sociais, mas havia um aumento silencioso das transacções monetárias. Mulheres relativamente abastadas compravam terras através de processos vernáculos. Lucinda Portugal da Silva Tomo, uma mulher divorciada, explicou: “Esta terra onde  vivo, consegui-a de um vizinho. Vendeu-ma ao preço de 40.000 meticais [equivalente a 7.799 rands sul-africanos] … Não tenho o DUAT para esta terra, mas tenho uma declaração, que foi escrita pelo antigo proprietário da terra”.

De qualquer forma, haverá perdedores e vencedores, mas, a longo prazo, a formalização limitará a flexibilidade associada a formas de vida com posse costumeira.

Dadas as implicações emergentes em termos de género, trazemos para o primeiro plano três amplos debates sobre o caminho a seguir à medida que os ouvimos do terreno, embora não tão bem expressos como abaixo.

  1. Em primeiro lugar, os decisores políticos, as OSC liberais e os seus membros locais acreditavam que a documentação codificada era a única forma de reforçar os direitos consuetudinários das mulheres à terra. Para eles, os desafios podem ser tecnicamente fixados através da melhoria da equidade de género na atribuição do DUAT, da sensibilização do público e da melhoria da participação das mulheres no processo de delimitação, da melhoria da aplicabilidade e transferibilidade do DUAT, e da democratização das estruturas locais e das instituições estatais. Isto implica manobrar dentro dos espaços proporcionados pelas políticas e, se necessário, revê-las para se adequarem ao projecto de formalização.
  2. Segundo, existe um grupo de titulares de direitos de uso da terra a longo prazo, OSC radicais e estruturas ‘tradicionais’, que acreditam que a posse costumeira não necessita de codificação e documentação para proporcionar segurança suficiente à posse das mulheres locais. Pensam que as mulheres pobres e vulneráveis são mais bem protegidas quando a posse costumeira permanece não codificada, flexível e adaptável às normas tradicionais. Para eles, o processo de documentação perturba os direitos legítimos à terra e a outros recursos naturais socialmente incorporados e a consequência a longo prazo é a expropriação dos pobres.
  3. Terceiro, existe um grupo de OSC moderadas, detentores de direitos de terra e decisores políticos marginalizados. Para eles, o reconhecimento e a codificação estatutária que procuram apoiar incrementalmente a flexibilidade e a adaptabilidade dos acordos consuetudinários existentes produzirá uma melhor segurança para as mulheres vulneráveis do que a imposição de um programa de formalização radical, pesado e dispendioso que dificilmente capta as suas experiências vividas. Tal abordagem mitigará as consequências involuntárias, como as que potencialmente se desenrolarão em Nhamatanda. Para elas, as deficiências podem ser tratadas através da remodelação incremental da posse costumeira a partir de baixo, e não a partir de cima.

Não pretendemos tomar posições definitivas para políticas com base na primeira fase do trabalho de campo. No entanto, esperamos que as implicações de género que captamos enriqueçam os debates sobre políticos públicas, para determinar em que as reformas dos sistemas de posse funcionam melhor para milhões de mulheres que vivem em terras costumeiras em África.

Nota dos autores: Gostaríamos de agradecer à Agência Austríaca de Desenvolvimento (ADA) pelo financiamento para o trabalho de campo. Contudo, os pontos de vista aqui expressos são inteiramente nossos.

Dr. Phillan Zamchiya é Investigador Principal no PLAAS, Joana Noyes é Coordenadora de Projectos na Livaningo e Clemente Ntauazi é Gestor de Programas na Livaningo.